6 de janeiro de 2017

Redução da maioridade penal não diminui quantidade de crimes, afirma consultora da Unicef






Países que adotaram sistemas mais severos de repressão da violência tiveram a criminalidade aumentada

Para a especialista na área de violência e consultora independente do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a advogada Karyna Sposato, o clamor da população por mais segurança e justiça social é compreensível, mas para decidir sobre um tema tão importante é preciso que a população busque mais informações sobre as consequências da aprovação da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. O assunto foi debatido nesta terça-feira (2) em audiência pública na Câmara dos Deputados.
Segundo a especialista, estatisticamente, a redução da maioridade penal não diminui a quantidade de crimes. “A punição não reduz a violência. Todos os países que adotaram sistemas mais severos de repressão da violência tiveram a criminalidade aumentada”, assegurou a representante do Unicef.
"A sociedade brasileira não sabe, por exemplo, que a responsabilidade penal do adolescente começa aos 12 anos. Tudo que é crime para o adulto, é crime para os adolescentes", atesta ela. A consultora explica que, entretanto, nesta idade o adolescente não vai para o mesmo sistema prisional dos adultos, e responde de forma diferente pelos crimes.
No Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estão previstas medidas de punição a jovens a partir de 12 anos que cometem delitos, inclusive de detenção, podendo ficar internados por até três anos. No Brasil existem 23 mil adolescentes privados de liberdade e destes, apenas 15% foram autores de crimes graves.
A solução, na opinião da advogada, está na reestruturação do sistema de responsabilização penal dos adolescentes. Segundo ela, é necessária uma reforma do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), mas sem a modificação da Constituição para a redução da maioridade penal. 
“Se queremos segurança, precisamos investir na prevenção do delito, e não nos debruçar apenas sobre a punição", afirma. Sposato afirma que todos os países que adotam a responsabilização dos adolescentes têm um sistema especializado, com lei especial e justiça especial. "O Brasil também tem, mas esse sistema precisa ser aperfeiçoado”, afirmou.
Diversos representantes de instituições nacionais e internacionais também se posicionam de forma contrária à redução da maioridade penal no Brasil. Coordenador do Programa de Justiça da ONG Conectas Direitos Humanos, Rafael Custodia falou ao Portal Planalto sobre a PEC 171/93. “No Brasil, é cada vez maior a reflexão que a resposta da Justiça Criminal não é capaz de, sozinha, resolver as questões de Segurança Pública", comenta.
Para Rafael Custodia, os aspectos negativos da redução da maioridade penal são vários. "A começar pelo aspecto simbólico: trata-se de uma sociedade que se propõe a desistir do adolescente de 16 e 17 anos. Não é no sistema prisional adulto que este cidadão vai aprender a conviver em sociedade", conclui.
Já segundo o diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque, a redução da maioridade vai reforçar um conjunto de preconceito que se coloca sobre o jovem, em especial sobre o jovem negro de periferia. "[A proposta] é uma verdadeira tragédia do ponto de vista civilizatório, e não tem nenhuma eficácia no combate ao crime." 
Ainda de acordo com Atila Roque, dados da Secretaria Nacional de Segurança Pública mostram que menos de 1% dos crimes é cometido por menores de idade na faixa dos 16 e 17 anos.
Legislação prevê punição de até 9 anos para os menores que cometem atos infracionais
Posicionamento do governo
Em abril deste ano, a presidenta Dilma Rousseff se manifestou contrária à proposta de redução. "Toda a experiência demonstra que a redução da maioridade penal não resolve a questão da violência. O governo defende que a pena seja agravada para o adulto que utilizar o jovem como escudo dentro de uma organização criminosa", afirmou.
Nesta segunda-feira (1º), o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), Edinho Silva, informou que presidenta solicitou que a Casa Civil coordene um grupo interministerial para discutir medidas de combate à impunidade, e também medidas de melhorias do ambiente social dos jovens, que muitas vezes quando deteriorado, leva o adolescente para a criminalidade. 
Mentes em formaçãoPara o secretário Nacional de Juventude, Gabriel Medina, a redução da maioridade penal é uma medida equivocada. Em entrevista ao Portal Brasil, ele afirmou que se a PEC 171 for aprovada, adolescentes que poderiam ter chance de reinserção social vão sofrer diversos tipos de violência. "São pessoas mais frágeis, como menos força que os adultos, que vão sofrer violências físicas e psicológicas na cadeia", afirmou.
Segundo Medina, a sociedade brasileira tem que saber que as consequências da redução não serão benéficas, já que os adolescentes serão expostos à influência direta de facções do crime organizado. 
"Vamos ter uma geração de jovens envolvidos com o crime cada vez mais cedo, mais perigosos, e que depois de cumprirem as suas penas, retornarão à sociedade com mais disposição de continuar uma trajetória de criminalidade", lamentou.
Uma das maiores preocupações do governo federal, de acordo com o secretário, é a interrupção de trajetórias de vidas que deveriam ter a chance de receber educação, inclusão em políticas sociais e trabalho digno. "Vamos encarcerar uma geração atrás das grades, com criminosos dos mais variados tipos, em presídios incapazes da ressocialização", finalizou.
Os adolescentes e as mortesEm nota divulgada no último mês de maio, a Organização das Nações Unidas (ONU) manifestou publicamente a preocupação da entidade com a possibilidade da aprovação da redução da maioridade penal no Brasil. Segundo a entidade, os adolescentes no País são mais vítimas do que autores de violência.
Estimativas das Nações Unidas mostram que dos quase 21 milhões de jovens brasileiros de 12 a 17 anos, apenas 0,013% cometeu atos contra a vida. Já quando se trata do número jovens assassinados, o Brasil é o segundo país no mundo em homicídios de adolescentes, atrás somente da Nigéria, sendo que a maioria são cidadãos negros e pobres que vivem nas periferias das grandes regiões metropolitanas.
Entre 2006 e 2012, mais de 33 mil brasileiros com idades entre 12 e 18 anos foram vítimas de homicídio, e outros 42 mil poderão ser mortos no período de 2013 a 2019.
Para a ONU, o Brasil está diante de um grave problema social que, se tratado exclusivamente como caso de polícia, poderá agravar a situação da violência no País.Para presidenta, isso não significa dizer que ela é favorável à impunidade
Fonte:
Portal Planalto, com informações da Organização das Nações Unidas, da Câmara dos Deputados,  da TV NBR e do Blog do Planalto

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