5 de fevereiro de 2015

José Manuel Moran, educador: ‘O professor não é o básico. É o filé mignon’





Novos parâmetros: Ex-professor da USP, hoje consultor, José Manuel defende modelo de educação "invertido" - Agência O Globo
“Nasci em Vigo, na região da Galícia, Espanha, e me naturalizei brasileiro em 1988. Tenho 68 anos e moro em São Paulo, onde dei aulas na USP. Hoje, trabalho sobretudo com projetos de educação voltados para novas metodologias de ensino redefinindo o papel dos professores nas salas de aula”
Conte algo que não sei.
Estamos passando de um modelo que se chama disciplinar, em que você divide as áreas de conhecimento por assuntos, como matemática, inglês, português, para modelos que já não fazem distinção entre áreas de conhecimento.
Como isso é possível?
São projetos que trabalham com problemas, desafios, como a Olin College, de engenharia, nos EUA, e o Insper, em São Paulo. São formados grupos de trabalho, em que você aprende colaborativamente a conviver, a negociar. Um modelo de educação bem diferente do que nós aprendemos.
Qual o papel do professor?
O professor não está ali para explicar o básico, mas para trabalhar as questões avançadas. O aluno sabe ler, assistir a um vídeo. Você dá algumas diretrizes para ele ir por conta própria e chegar até determinado ponto. Aí vem o professor e problematiza, faz relações que os alunos não conseguem fazer ainda. O professor não é o básico. É o “filé mignon". É o modelo que se chama aula invertida. É complexo, mas faz sentido num mundo em que o conteúdo é muito movediço, evolui. A sala de aula tem que ser um espaço vivo, de trocas, de resultados, de pesquisas.
Como seriam as avaliações?
Contínuas. Professores orientam os alunos a trabalharem com algumas atividades. Na hora em que acham que eles já dominaram o assunto, fazem uma avaliação, que tem resultado instantâneo, e é vista pelo aluno e pelo professor. A avaliação vai por etapas, mas não é limitadora.
O processo nunca termina?
Você refaz. O erro faz parte do processo de aprendizagem e você depois avalia o processo como um todo. Onde você estava no começo e onde está agora? Não é a prova final que vai te determinar, mas o conjunto das situações. Essa avaliação não é só de conhecimento, é também das competências amplas. Você avalia a capacidade que o aluno tem de enfrentar desafios, lidar com o fracasso, conviver em grupo.
É bem complexo...
É difícil, mas senão você não prepara para esse mundo daí. Preparar para o Enem é uma parte, é um parâmetro. Não digo que seja inútil. Mas você pode preparar uma pessoa para o Enem e, no fundo, não prepará-la para a vida.
O Enem busca avaliar competências...
Acho que mede algumas competências, mas escapam coisas. Você pede uma redação sobre um assunto, mas pode ser um tema que a pessoa não domina. Se você pudesse escrever sobre algo que você domina, pelo que tem entusiasmo, sua escrita seria outra. A gente precisa de alguns parâmetros nacionais para medir algumas coisas. Mas, usá-los como critérios fundamentais, me preocupa. Não sou contra, mas me preocupa a banalização do Enem como uma espécie de meta, de Santo Graal.
O que procurou passar na educação dos seus filhos?
Criei meus filhos para terem uma boa formação e depois tomarem as decisões que acharem melhores. Por enquanto, tomaram a decisão de morar fora do Brasil. Minha filha mora em Barcelona, e meu filho, em Nova York. Eu e minha mulher educamos dentro dessa visão de autonomia. Você tem que educar os filhos para o mundo. Aí, eles vão para o mundo, e você tem que aceitar.

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