21 de setembro de 2014

MARCELO LEITE ,Perdidos na floresta


  • Conformar-se com taxas de 6,5% de inflação e 6.000 km2 de desmatamento é o cúmulo da mediocridade
    Neste domingo (21) se realiza em Nova York uma marcha em que milhares de pessoas pedirão mais ação contra a mudança do clima e a favor das florestas. Mesmo com Marina Silva no páreo para a Presidência da República, dá para imaginar assunto mais distante da campanha eleitoral brasileira?
    Na terça-feira (23), durante a Cúpula do Clima na ONU, dúzias de governos, ONGs e multinacionais lançarão um manifesto em defesa das florestas tropicais. O Brasil, com a maior extensão de matas, até o momento em que escrevo não havia aderido oficialmente à convocação.
    E olhe que o país tem muito de que se gabar nessa matéria. Poderia assumir tranquilamente uma posição de proa nesse processo mundial, mas abdica da vocação para insistir numa visão antiquada de desenvolvimento econômico.
    Nos últimos dez anos, o país derrubou a taxa de desmatamento de 27.772 km2 em 2004 para 5.891 km2 em 2013. Florestas destruídas emitem o carbono contido na biomassa (folhas, madeira, raízes). Com a redução do desmate, o Brasil deu a maior contribuição individual para cortar gases do efeito estufa e assim arrefecer o aquecimento global.
    Sim, é fato que houve um aumento de 29% na taxa de devastação de 2012 para 2013. Há motivo para preocupação, pois a iniciativa política retomada pelos ruralistas tem tirado força das medidas de contenção do desmatamento ""do Código Florestal às terras indígenas.
    A situação é parecida com a da taxa de inflação. Fatores e pressões altistas continuam atuantes, mas a coisa está longe de sair do controle. Por outro lado, conformar-se com taxas anuais de 6,5% e de 6.000 km2 é o cúmulo da mediocridade.
    Nada a estranhar, porém, para quem pensa que inflação alta é uma vitória dos trabalhadores contra o capital, ou que as emissões de carbono pelo desmatamento e pela exploração do pré-sal são o preço a pagar por mais desenvolvimento.
    A marcha e o manifesto de Nova York assinalam --e também o estudo "Crescimento Melhor, Clima Melhor" (newclimateeconomy.report), divulgado na terça-feira (16)-- que esse preço pode ser alto demais. O desenvolvimento "barato", quer dizer, pela via da dilapidação dos recursos naturais, vai custar caro.
    No caso do desmatamento, o Brasil já demonstrou para si mesmo e para o mundo que é possível crescer destruindo pouco e agredindo menos a atmosfera. Recebe elogios rasgados por isso nos relatórios de ONGs e países "imperialistas" que dão engulhos aos xenófobos tupiniquins, de generais de pijama a viúvas do leninismo e do maoísmo.
    O último elogio veio no volume "State of the Rainforest" (estado das florestas chuvosas, www.grida.no/publications/soe-rain-forest), divulgado na quinta-feira (18) pela Rainforest Foundation da Noruega. Fala de um "desenvolvimento muito encorajador no Brasil" e de "resultado direto de decisões políticas".
    O trabalho cita estimativa da Universidade de Maryland (EUA) de que 92 mil km2 de matas tropicais pereçam a cada ano. O Brasil seria, assim, responsável só por 6,5% da destruição, mesmo com a maior floresta tropical do planeta.
    Isso, claro, se se computar apenas a Amazônia. Incluídos cerrado, mata atlântica e caatinga, o desmatamento brasileiro sobe para 12.000 km2. Ainda assim, razoáveis 13%.
    Por que Dilma Rousseff se esquiva da meta de desmatamento zero?

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