18 de abril de 2014

Universidade de Brasília (52 anos): os caminhos do futuro, Isaac Roitman



No dia 21 de abril de 2014, a UnB completa 52 anos. Ela foi criada em um momento em que a sociedade brasileira estava convencida de que o sistema universitário brasileiro clamava por um  modelo inovador. Sob o comando de Anisío Teixeira e Darcy Ribeiro, e com o apoio da intelectualidade brasileira, ela iniciou suas atividades em 21 de abril de 1962. Em 1965, o projeto original foi interrompido após demissão da maioria de seus professores, episódio épico descrito por Roberto Salmeron em seu livro “A Universidade Interrompida”. No final da década de 60, um grande esforço foi feito para a reestruturação da universidade com a fixação de professores em todas as áreas do conhecimento. A UnB renasceu e floresceu.
Atualmente, a comunidade da UnB é constituída por cerca de 40.000 pessoas com a seguinte distribuição: cerca de 29.000 alunos de graduação e 6.300 de pós-graduação, 2.445 professores e 2.630 técnicos-administrativos, distribuídos em 26 institutos e faculdades e 21 centros de pesquisas. Além do campus Darcy Ribeiro (Asa Norte), a UnB tem três campi em cidades satélites: Ceilândia, Gama e Planaltina.
Durante a comemoração do cinquentenário da UnB, através da Comissão UnB 50 anos, foram revisitadas as cinco décadas da UnB por meio de vários  instrumentos: conferências, debates, livros, filmes, depoimentos, exposições, eventos culturais, etc. Procurou-se identificar os acertos, os erros e as omissões. Os registros dessas atividades podem ser encontrados na página da Comissão. Elas foram encerradas no dia 22/04/2013 quando foi instalada a Comissão UnB.Futuro, carinhosamente apelidada de Pensódromo, uma parceria do Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação (DPP) com o Núcleo de Estudos do Futuro (n-Futuros/CEAM). E foi aberto, então, um espaço para discussão dos rumos da UnB, das universidades brasileiras e da educação como um todo. A Comissão tem a seguinte composição: Adalgisa Rosário, Aldo Paviani, Ellen Worthman, Fernanda Antonia Fonseca Sobral, Fernando Molina, Fernando Oliveira Paulino, Isaac Roitman, Jaime Martins Santana, José Cordoba Coutinho, Manoel Marcos Formiga e Vladmir Carvalho.
No dia do 52º aniversário da UnB, a Comissão UnB.Futuro comemora o seu primeiro ano de vida.  Até o momento, promoveu 13 eventos (oito em 2013 e quatro em 2014). Em cada evento, um tema foi debatido após a apresentação de um especialista. Os seguintes temas foram discutidos em 2013: 1. “O que é necessário para que a Universidade seja vanguarda no pensamento contemporâneo” - Cristovam Buarque (Professor Emérito da UnB e Senador da República); 2. “O que é necessário para que a universidade seja vanguarda no pensamento contemporâneo” – Mozart Neves Ramos (ex-reitor da Universidade Federal de Pernambuco e membro do Conselho Nacional de Educação); 3. “Autonomia e o futuro da Universidade” –  Paulo Speller (ex-reitor da Universidade Federal do Mato Grosso e Secretário de Ensino Superior do Ministério da Educação); Debatedor: Lauro Mohry (ex-reitor da UnB); 4. “A Universidade e o futuro da Medicina” – Adib Jatene (ex-ministro da Saúde) – o evento foi também a Aula Magna dos Cursos da Faculdade de Medicina e da Faculdade de Ciências da Saúde”; 5. “A nova Universidade Nova” – Naomar de Almeida Filho (ex-reitor da Universidade Federal da Bahia e atual reitor da Universidade Federal do Sul da Bahia); 6. “As Universidades Federais como um Sistema” – Edward Madureira Brasil (reitor da Universidade Federal de Goiás); 7. “A Universidade do Futuro” – Pascal Smet (ministro da Educação da Bélgica) e 8. “A Inovação na Universidade do Século XXI” – Alvaro Troubles Prata (ex-reitor da Universidade Federal de Santa Catarina e atual Secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação). Foram também realizados dois eventos satélites: 1. “A Universidade do Futuro, o Futuro da Universidade” – Antônio Nóvoa (reitor da Universidade de Lisboa / Portugal) -, evento realizado em parceria com o Decanato de Graduação da UnB, e 2. O Homem e o Futuro da Ciência” – Marcelo Gleiser (Professor do Darmouth College / USA) - evento  realizado em parceria com a Comissão de Ciência,  Tecnologia, Informática e Comunicação do Senado Federal, fazendo parte do Seminário “Caminhos para a Inovação”.
Em 2014, os seguintes eventos foram realizados: 1. “A grande mutação das Ciências Sociais  contemporâneas” (Professor Michel Wieviorka, presidente da Foundation de la Maison des Sciences de l’Homme /  Paris); 2. “As Tecnologias de Informação e Comunicação e a Universidade do Futuro (Professor Andrew Feenberg, Simon Fraser University / Canadá); 3. “Comércio Internacional e o papel da Organização Mundial do Comércio (Roberto Carvalho de Azevêdo, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio); 4. “A Universidade da Singularity e as Novas Fronteiras do Conhecimento” (José Luis Cordeiro, professor e fundador da Singularity University / USA).
Os registros de todos os eventos podem ser visitados no Portal da Comissão, assim como matérias, artigos, livros, vídeos, etc. Serão produzidos resumos executivos com as proposições de cada evento. Todos os eventos serão reunidos em livros. O primeiro volume está previsto para ser lançado em outubro de 2014. Os temas convergentes estão destacados abaixo:
1. A Universidade e o ensino básico: A UnB assim como as outras Universidades brasileiras têm um papel fundamental para a conquista da qualidade da educação básica  brasileira que deve ser disponilizadas a todas as crianças e jovens brasileiros. Essa conquista será o balizador da qualidade de vida das futuras gerações e, como pregava Anísio Teixeira, será o pilar da democracia. A responsabilidade da Universidade como protagonista fundamental para a conquista da qualidade no ensino básico  foi apontada repetidamente como missão prioritária. Primeiramente por ser a universidade a responsável pela formação do professor. Em adição, é absolutamente necessária uma integração maior entre o ensino superior e o ensino básico. A comunidade universitária – estudantes e professores – devem estar sempre presentes nos espaços educacionais do ensino básico, participando ativamente do processo educacional. A presença de estudantes do ensino básico nos eventos universitários – conferências, feiras científicas, espetáculos culturais, debates, etc deverá ser parte do cotidiano escolar.
2. Autonomia: Para que a Universidade possa desempenhar adequadamente a sua missão, um outro tema recorrente no âmbito da Comissão foi a sua autonomia plena. As amarras burocráticas e uma legislação atrasada são obstáculos para que a Universidade brasileira possa assumir os desafios contemporâneos. Apesar de prevista na Constituição brasileira, essa autonomia ainda não é exercida de modo autônomo e independente no cotidiano das universidades que se constituem como espaço de formação de recursos humanos, de produção e socialização do saber.
3. Equilíbrio: O equilíbrio na valorização dos três pilares da universidade: pesquisa, ensino e extensão foi também um tema recorrente. Além de ser necessário revisar de forma permanente os indicadores da produção científica, é preciso criar indicadores que valorizem o ensino e a extensão como atividades prioritárias e o reconhecimento dessas atividades para a progressão na carreira acadêmica.
4. A escolha dos dirigentes: Essa temática foi um  tema muito discutido nos debates da Comissão. É pertinente que ocorra um ampla reflexão que aponte para o aperfeiçoamento do processo de escolhas dos dirigentes.
5. Inovação na Universidade. A relação da Universidade com o setor produtivo deverá ter como pano de fundo um desenvolvimento econômico que possa ser repartido com equidade com toda a sociedade brasileira. Atualmente, o sucesso ou não das empresas está associado diretamente à capacidade de inovar. A aproximação da universidade com o setor produtivo é imperativa.
6. Novos modelos de Universidade: A necessidade de transformação da Universidade em uma entidade que tenha legitimidade e um papel fundamental na vanguarda dos pensamentos contemporâneos foi consensual. O estudo de caso foi a apresentação e a discussão de uma universidade que nasce em 2014: a Universidade Federal do Sul da Bahia onde um novo modelo de universidade será experimentado, revisitando os princípios do mestre Anísio Teixeira.
7. Cultura universitária e responsabilidade social: É preciso estimular e criar instrumentos para que os estudantes possam, durante a sua passagem pela Universidade, terem, além de uma formação profissional de qualidade, a oportunidade de consolidar uma cultura em todas as áreas de conhecimento. Em adição à qualificação profissional e à cultura universitária, os estudantes devem ser preparados para terem, em suas atividades futuras, a consciência de sua responsabilidade social.
8. Internacionalização: O intercâmbio com universidades do exterior deverá ser estimulado através de projetos de cooperação na produção de conhecimento e da mobilidade de professores e estudantes. Esse intercâmbio deve ter duas vias: envio de estudantes e professores para o exterior e vinda de estudantes e professores do exterior. Os modelos pedagógicos e de organização introduzidos em outros países devem ter um acompanhamento e avaliação constantes.
9. Interdisciplinaridade: A atuação deverá ser cada vez mais pluridisciplinar, aliando e articulando conhecimentos de diferentes áreas nas investigações. Por outro lado, os projetos de natureza transversal são importantes instrumentos para reagir a um relativismo em que prevalece a ideia de que cada um no seu campo possui a verdade, sem se preocupar com o que as outras áreas desenvolvem.
10. Tecnologias de informação e comunicação: O aprendizado on-line trouxe para a educação mudanças que já estão ocorrendo em outros setores da sociedade. Uma das mais importantes é a “desintermediação” da transferência de conhecimento. A utilização de novas tecnologias impõe reflexões e várias indagações: 1. Será que o nosso mundo social foi colonizado pela tecnologia ou vamos impor nossos imperativos de comunicação na ordem tecnocrática da computação? 2. Será que o próprio sentido da educação será transformado para se adequar aos limites de sistemas automatizados ou será que a tecnologia educacional será desenvolvida para servir algo como a educação como a conhecemos? 3. É evidente que estas questões escondem uma questão mais profunda sobre a relação da tecnologia com a sociedade. Como fica o  aprendizado atual geralmente formal e socialmente controlados diante da explosão do aprendizado informal e mediado digitalmente?
11. Fronteiras do conhecimento: As tecnologias emergentes do sistema (NBIC: nanotecnologia, biotecnologia, informação e cognição) certamente causaram uma revolução na sociedade humana. Graças à globalização, essas tecnologias tem se difundido cada vez mais rapidamente e o desenvolvimento das ferramentas tecnológicas torna-se mais acelerado e acessível. A Universidade não pode estar alheia a esse processo.
12. O papel do educador: O papel número um do educador não é formar mão de obra especializada ou qualificada para o mercado de trabalho. É formar seres humanos felizes, dignos, dotados de consciência crítica, participantes ativos no desafio permanente de aprimorar a sociedade e o mundo em que vivemos.  
13. Uma Universidade socialmente relevante: É fundamental o comprometimento das estruturas acadêmicas com programas sociais relevantes, capazes de contribuir para a solução de problemas nacionais inadiáveis, superando distintas modalidades de exclusão ou carência estrutural: sanitária, educacional, produtiva, etc. A instituição universitária não pode abdicar de sua função pública primordial de espaço de preservação e renovação dos valores democráticos e republicanos em uma arena de pensamento crítico e inquieto. A universidade não pode sucumbir à lógica do mercado e silenciar diante das injustiças e desigualdades engendradas pela lógica da acumulação a qualquer preço. Nessa perspectiva transformadora, torna-se imprescindível a inserção orgânica, nos projetos pedagógicos dos cursos de graduação, de atividades acadêmicas voltadas para a relevância social comumente designadas como atividades de extensão universitária.
Desafios do futuro - Como aponta Cristovam Buarque em seu livro “A aventura da Universidade” (Editora Paz e Terra, 1994), a universidade, para enfrentar os desafios do futuro, tem de ter consciência plena e renovar-se de forma a ajustar o seu trabalho às exigências da ruptura com a crença na utopia obsoleta e sua substituição por novos objetivos civilizatórios.
A universidade terá de reorientar sua participação no sentido de que o objetivo social, em vez de ampliar o consumo, deva ser a construção de uma sociedade com crescente disponibilidade de tempo livre e com o uso deste tempo para as atividades de enriquecimento cultural. Ela deve desempenhar o papel revolucionário das idéias e ser uma instituição de construção do novo. Para tanto, o primeiro passo deverá romper as amarras que aprisionam a universidade ao passado e ao presente, para a universidade voltada para o futuro.
A universidade atua em um contexto de complexidade e incerteza, onde são exigidas novas interfaces com a sociedade, visando capturar suas necessidades e demandas. Neste balanço, entre demanda e capacidade de resposta, a flexibilidade e a capacidade de adaptação são aspectos importantes, sendo fundamental a preservação dos valores acadêmicos, expressos nas atividades de ensino, pesquisa e extensão.
É dentro desse ambiente de desafios que a universidade pode e deve utilizar a técnica de cenários, pois auxilia estas instituições preparando-as para as diversas possibilidades de acontecimentos futuros, ensejando a tomada de decisão com maior eficiência e eficácia, e, conseqüentemente, tornando-as aptas à formulação de um planejamento organizacional adequado, flexível e com visão de futuro.
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário