29 de outubro de 2012

Tapando o sol com peneira: Violencia em São Paulo


29 de outubro de 2012 | 3h 05

O Estado de S.Paulo
Entre 2009 e 2011, o governo paulista conseguiu a proeza de reduzir o índice de homicídios dolosos de impressionantes 35,27 mortes por 100 mil habitantes para 9,9 por 100 mil no Estado. Essa conquista resultou da prioridade dada à segurança pública, traduzida pelo aumento de 70% do orçamento dessa área desde 2001. O esforço chegou a ser notado pela ONU, que em seu Estudo Global de Homicídios de 2011 elogiou "as significativas possibilidades de prevenção do crime" oferecidas pela experiência paulista. No entanto, a julgar pela disparada dos números da violência na capital neste ano, em especial nos últimos meses, o modelo dá sinais de que perdeu sua eficácia. Não se trata mais simplesmente de combater a criminalidade comum, mas de conseguir enfrentar de maneira inteligente o crime organizado, cujo papel na atual onda de violência é indiscutível.
A última estatística divulgada pela Secretaria da Segurança Pública indica que houve 144 vítimas de homicídio em setembro passado na cidade de São Paulo, um número 96% maior do que o registrado em setembro de 2011. De janeiro a setembro, o aumento foi de 22%. No Estado, o crescimento foi de 27% em setembro e de 8% no ano. Ao menos na capital, o repique coincide com a onda de assassinatos de policiais militares (PMs) e a subsequente morte de civis em aparentes ações de vingança de PMs. Houve também aumento acentuado do crime de latrocínio, que atingiu o maior número de ocorrências desde 2004.
O governo apressou-se em dizer que não há nada de novo sob o sol. O comandante da PM, Roberval França, afirmou que houve mais casos de mortes por motivos passionais ou por brigas de trânsito e também ataques entre criminosos e por cobrança de dívidas de drogas. Ele atribuiu parte dos crimes a presos que não voltaram à prisão após terem sido indultados. O governador Geraldo Alckmin também considera que o elevado número de mortos se deve basicamente a disputas entre quadrilhas e a acerto de contas. Alckmin disse acreditar que o crime organizado esteja reagindo ao combate do governo ao tráfico de drogas. Ele reiterou que "o governo não vai retroagir um milímetro" e que a ordem "é ir para cima de criminoso".
O esforço do governo para minimizar os dados da violência pode ser resumido pela nota sobre o assunto no site da Secretaria da Segurança Pública. O destaque é dado não para o aumento preocupante dos homicídios, mas para a redução dos crimes contra o patrimônio (23% em setembro na comparação com o mesmo mês de 2011). Em seguida, a nota salienta que houve crescimento de 9,46% no número de criminosos presos e de 15,35% na apreensão de drogas. Só então o comunicado menciona os assassinatos, mas diz que houve apenas uma "pequena alta", usando para isso a relação entre o número de homicídios por 100 mil habitantes, que passou de 10,37 para 10,56. E arremata relembrando que "São Paulo registrou a maior diminuição de criminalidade que se tem notícia no mundo nos últimos anos".
De fato, não se pode menosprezar todo o trabalho do governo nem simplificar a questão, mas também é inegável que as autoridades atualmente não estão em vantagem em relação ao crime organizado. Como a ilustrar tal situação, nove pessoas foram mortas somente entre a noite de quarta-feira e a madrugada de quinta, numa série de ataques a tiros na capital e na Grande São Paulo. Entre os assassinados, dois eram policiais militares, elevando para 86 o total de soldados mortos em 2012, cinco deles só em setembro. A maioria não estava em serviço e parece ter sido alvo deliberado dos bandidos. Diante dessas reiteradas provas de recrudescimento da violência, não é sensato subestimar a inteligência dos cidadãos, como vêm fazendo os responsáveis pela segurança pública - que negam a existência de uma epidemia de crimes, minimizam o poder dos bandidos e aceitam a vingança, pura e simples, como forma de combate. Ao fazê-lo, o governo do Estado comete um equívoco importante num confronto que São Paulo não pode se dar ao luxo de perder.

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