30 de setembro de 2012

Avanço do emprego deixou para trás mulheres, jovens e trabalhadores sem qualificação


RIO e RECIFE - Larissa Maria, de 18 anos, procura emprego. Mas, sem sequer ter concluído o nível médio, não consegue. Vai, então, vivendo de biscate para sustentar a filha. Carteira assinada? Ainda um sonho. Larissa — mulher, jovem, negra, pouca formação, sem experiência — dá o tom do desemprego brasileiro: é feminino.
Os anos recentes de crescimento econômico ainda não foram fortes o suficiente para quebrar o padrão do mercado de trabalho do país — que dá preferência ao homem em detrimento à mulher. Só que são as jovens, como Larissa, as maiores vítimas dessa desigualdade que persiste no país.
Um fenômeno mundial
Os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), que traz o maior retrato do mercado do trabalho do país, mostram isso. Dentro da taxa média de desocupação, de 6,7% em 2011, a distância entre homens e mulheres aparece. As taxas são, respectivamente, de 4,9% para eles — quase pleno emprego — e 9,1% para elas. Entre os mais jovens, de 18 a 24 anos, a desigualdade fica mais expressiva. Os rapazes têm taxa de desemprego de 10,6%. Elevada, contudo, bem menos que os 18% da taxa das moças. Mas já foi pior: há 10 anos, a taxa delas era de 21,5%. E eles amargavam um desemprego de 13,7%.
— O mercado de trabalho avançou, mas não conseguiu beneficiar a todos. E ainda impôs barreiras. Formação ruim é o que deixou muito jovem pra trás — diz Cimar Azeredo, do IBGE.
Não à toa, portanto, Larissa decidiu agir por conta própria, para garantir o próprio sustento: faz serviço de manicure em domicílio.
— Quando menor, procurei estágio. Consegui por meio salário mínimo. Era muito pouco e desisti de ficar lá — conta.
Como a desigualdade se sustenta no país onde as mulheres têm escolaridade maior do que a dos homens (7,5 anos contra 7,1)? Mesmo entre os mais jovens, de 18 anos ou mais, elas passam mais tempo na escola — 7,9 anos contra 7,5. Boa parte dessa resposta está no preconceito ainda vivo do mercado de trabalho brasileiro, avalia Rebecca Reichmann Tavares, Representante e Diretora Regional da ONU Mulheres (braço das Nações Unidas para igualdade de gêneros) no Brasil e Cone Sul:
— O preconceito explica parte da distância entre a desocupação de homens e mulheres, além da desigualdade dos rendimentos. Mas esse quadro não é um fenômeno brasileiro, é mundial. Num estudo com 187 países, o país ocupa a 84ª colocação no ranking de desigualdade de gênero. O Brasil não está fora da curva, mas isso não deve ser motivo para não fazer nada. Apenas as leis conseguem se sobrepor a valores culturais. Esse foi o caminho de países do Norte da Europa que adotaram, por exemplo, cotas para mulheres.
Segundo Cláudio Dedecca, professor da Unicamp, a força física é um atributo que ainda tira oportunidades das mulheres, especialmente quando se fala no mercado de trabalho longe dos grandes centros e de setores como construção civil e agricultura.
— O desemprego atinge estruturalmente mais a mulher. A preferência é do homem porque tem a vantagem, do ponto de vista do empregador, de não ter licença maternidade ou de não ser o cuidador oficial dos filhos. Mas esse padrão de contratação masculina tende a se retrair com um crescimento mais sustentado da economia. O desafio é acelerar o crescimento — afirma Dedecca.
Menos empregadas
Há especialistas que defendem que as mulheres ocupam, tradicionalmente, cargos de menor remuneração. Mas Rebecca refuta a justificativa:
— Muitas mulheres estão em funções de menor ganho, sim. Mas, ainda assim, em funções similares, pesquisas já mostraram que as mulheres ganham menos.
A Pnad mostrou, entretanto, avanços. O emprego doméstico já não é mais a ocupação número um das mulheres. Agora, há mais mulheres ocupadas no comércio (6,6 milhões) do que empregadas domésticas (6,1 milhões).
— À medida que o país se desenvolve, o emprego doméstico se torna menos expressivo. Com mais formação, a mulher pode escolher, e não quer mais ser empregada. É um cenário positivo — diz Miguel Foguel, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
*Colaborou Letícia Lins

Nenhum comentário:

Postar um comentário