18 de abril de 2011

Vidas terminam ainda durante adolescência:Mapa da Violencia 2011



17 de abril de 2011
  Portal ORM  PA


Assassinatos são a principal causa de morte entre adolescentes e jovens no Pará. Metade das vítimas tem entre 15 e 24 anos. A idade mais crítica, porém, é 18 anos. Negros e pobres são a maioria, revela relatório do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca-Emaús). Os números também mostram que eles não são os protagonistas da violência urbana e, embora envolvidos em situações violentas, são o elo mais frágil de esquemas criminosos e das pressões da sociedade para o combate ao crime. No Pará, o adolescente sob ameaça de morte é do sexo masculino, negro, tem de 13 a 17 anos e renda per capita de um salário mínimo. No documento chamado de 'Letalidade de Adolescentes e Jovens no Pará', o Cedeca-Emaús observa que o jovem sob ameaça de morte representa, na verdade, um certificado da inoperância das políticas públicas, 'uma vez que este cidadão em fase de desenvolvimento já passou por todas as existentes e nenhuma delas deu conta de romper com o ciclo de violência vivido até então', aponta o documento, que denuncia os assassinatos de jovens e adolescentes como a culminância do ciclo de violações vivenciado por eles desde o nascimento.
Em contrapartida, o Cedeca-Emaús denuncia o movimento que os responsabiliza pela violência e acredita que a punição, em detrimento da proteção, resolverá o 'problema' da infância e da juventude, em particular, e da segurança pública de modo geral. 'Em momentos de euforia, a sociedade defende, sem reflexão alguma, a redução da maioridade penal, a violência banalizada e até a pena de morte (institucionalizada ou na forma de linchamentos) contra adolescentes, acreditando ser esta a melhor forma de encontrar a paz social', afirma o relatório.
Segundo a coordenadora do Cedeca-Emaús, Celina Hamoy, o relatório levanta informações para subsidiar uma intervenção mais localizada no tema da letalidade. 'A situação se apresenta muito grave e, se não houver um olhar coletivo, isso, com certeza, só será agravado', afirma. Ela acrescenta: 'Precisamos trabalhar com indicadores oficiais na busca de resultados que alterem a realidade de violência.'
O relatório do Cedeca-Emaús cita dois indicadores para mensurar o nível de letalidade de adolescentes e jovens no Brasil e no Pará: o Mapa da Violência, produzido pelo Instituto Sangari e Ministério da Justiça, e o Índice de Homicídios na Adolescência (IHA), do Programa de Redução da Violência Letal, do Observatório das Favelas, Laboratório de Análise da Violência, Secretaria Nacional de Direitos Humanos e Unicef. Ambos mostram o crescente número de mortes violentas, sobretudo entre pessoas com idades entre 12 e 24 anos, e apontam que o Pará está entre os campeões em homicídios, com violência crescente.
Cedeca busca respostas para o problema - O Índice de Homicídios na Adolescência (IHA) é outro indicador que sugere um grave quadro de violência letal, informa o relatório do Cedeca-Emaús. O índice aponta o número de adolescentes que, com 12 anos em 2006, poderão não completar 19 anos em função de terem sido assassinados. O estudo analisou 267 municípios e apontou que o número de adolescentes assassinados entre 2006 e 2012 no Brasil deverá ultrapassar 33 mil se não mudarem as condições que prevaleciam nas cidades estudadas. O trabalho demonstra que a probabilidade de ser assassinado é quase 12 vezes maior quando o adolescente é do sexo masculino que do feminino. O risco também é quase três vezes maior para os negros em comparação aos brancos.
O valor médio do IHA para os 267 municípios estudados é de 2,03 jovens mortos por homicídio antes de completar os 19 anos, para cada grupo de mil adolescentes de 12 anos. Mas há localidades onde o índice é extremamente elevado se comparado com essa média. E, diante desse cenário, o Cedeca-Emaús faz os seguintes questionamentos: por que tantos adolescentes e jovens continuam sendo mortos como se estivessem em uma guerra? Por que a preferência pelos negros e pobres e por aqueles que assustam, por serem distintos ou agirem diferentemente daquilo que se espera deles? Por que a sociedade se furta a tomar conhecimento das mortes e, em casos extremos - mas não raros -, apóia o extermínio? E por que, enfim, o Estado investe tão pouco para evitar a violência?
Adolescentes são os que sofrem e não os propulsores da violência
O relatório do Cedeca-Emaús aponta que os adolescentes e jovens são as vítimas e não os propulsores da criminalidade. Segundo o Mapa da Vilência, produzido pelo Instituto Sangari, a taxa de homicídios entre jovens passou de 30 indivíduos (a cada 100 mil), em 1980, para 52,9 indivíduos em 2008. Na população não-jovem a taxa se manteve inalterada, com leve queda, passando de 21,2 em 1980 para 20,5 em 2008. Até os 12 anos, o número de vítimas é relativamente baixo. Mas a partir dos 13 anos, as vítimas se proliferam, até alcançar o pico na faixa dos 20 anos. É na faixa entre 15 e 24 anos que os homicídios atingem sua máxima expressão, com taxas em torno de 63 mortes a cada 100 mil habitantes.
Ao cruzar a causa da morte, o tipo e a faixa etária, o Mapa mostra que 73% dos jovens brasileiros morrem por causas externas, 62% deles por mortes violentas. Na população adulta, as mortes por causas externas não ultrapassam 10%. No Pará, 70% das mortes de jovens são por fatores externos, 62% dos quais por violência. Na população não-jovem, apenas 11% morrem por fatores externos no Pará.
Entre os jovens assassinados no Pará, 48% têm entre 15 e 24 anos, mas a idade mais crítica é 18 anos. No Pará, em 1998, a taxa geral de homicídios era de 13,3 a cada 100 mil habitantes, a 19ª posição no ranking nacional. Em 2008, a taxa saltou para 39,2 e o Estado passou à quarta posição no ranking.
Na faixa entre 15 e 24 anos, o Estado ocupava a 16ª posição, com uma taxa de 24,1 assassinatos a cada 100 mil. Em 2008, o Estado era o oitavo colocado, com 71,3 mortes a cada 100 mil habitantes. Em números reais, o Estado e sua capital mostram também crescimento no número de mortes na faixa entre 15 e 24 anos, 265,7% para o primeiro e 95,2% para a segunda. Isso significa que, em 2008, quase três adolescentes foram assassinados por dia no Pará - 287 deles só na capital. O Pará também aparece com destaque em relação à violência letal contra jovens moradores do interior. Entre os 100 municípios brasileiros mais violentos e com maior possibilidade de homicídio para jovens, nove (quase 10%) são paraenses, sendo três deles na Região Metropolitana. Eis os municípios: Marabá, Ananindeua, Tailândia, Parauapebas, Marituba, Tucuruí, Belém, Paragominas e Castanhal. Marabá e Ananindeua também estão entre os dez municípios em que os jovens estão mais ameaçados. Se essa avaliação for ampliada para os 50 municípios mais ameaçadores do Brasil, pode-se incluir ainda Tailândia, Parauapebas, Marituba e Tucuruí.
Garotos sabem que não terão vida longa, diz pesquisador da UFPA
Roubar, cheirar cocaína e matar é o objetivo de vida para muitos jovens da periferia de Belém, segundo o pesquisador Aiala Colares, que apresentou dissertação de mestrado ao Núcleo de Altos Estados Amazônicos (NAEA), da Universidade Federal do Pará, em que aponta os dez bairros com maior número de homicídios na capital paraense. A pesquisa engloba o período de 2005 a 2009, mostra que os jovens que matam e morrem têm entre 14 e 24 anos e sabem que não terão uma vida longa. Por essa razão, querem aproveitar a vida ao máximo e à maneira deles. 'Esses jovens não têm mais esperança, perspectivas de vida', afirma Aiala, ao recomendar políticas públicas que levem em consideração a realidade e os bairros onde vivem esses jovens, para além das ações de repressão do Estado visando ao enfrentamento da criminalidade. São ações que passam pelo esporte, lazer, educação, mas que também alcancem os dependentes de drogas. 'A maioria dos jovens envolvidos nesses homicídios frequentou a escola. Mas, por algum motivo, parou de frequentá-la', observa o pesquisador.
Aiala defende uma parceria entre o Estado, a comunidade e a escola para a doção de políticas sociais nesses bairros que criem uma nova cultura. 'O que predomina nas periferias de Belém, entre os jovens, é a cultura do crime', diz ele, ao observar que o jovem que anda armado tem poder e passa a ser reconhecido entre os outros. 'É uma forma de afirmação no grupo e ele não pensa duas vezes antes de puxar o gatilho', diz. A subcultura do crime se manifesta, por exemplo, em códigos próprios de linguagem, no modo de se vestir, no tipo de festa que frequentam e na cocaína que consomem. O jovem envolvido no crime é negro, pobre, tem baixa escolaridade e família desestruturada. 'A maioria não sabe quem é o pai. Ou o pai é alcoólatra. Mora com a mãe, empregada doméstica ou que faz bico para ganhar a vida. Tem que trabalhar para ajudar a família. Aí, acaba indo para a rua e entrando para o crime', diz.
Tráfico - Nos dez bairros com maior número de homicídios, muitas das mortes têm a ver com o tráfico de drogas. Mas há também o latrocínio (roubo seguido de morte), as mortes entre os próprios bandidos e as que resultam do confronto com policiais. Nesses bairros impera a precariedade da infraestrutura urbana e um conjunto de situações favoráveis à criminalidade.
O pesquisador diz que o cidadão de bem anda acuado por causa dos roubos, sequestro relâmpago, saidinha bancária. 'Há toda uma rede criminosa. O Estado está praticamente perdendo o controle sobre essa situação. E a sociedade vai recorrer a quem?', pergunta. Os dez bairros com maior número de homicídios, apontados nessa pesquisa, são: Guamá (226 assassinatos); Terra Firme (186); Bengui (150); Cabanagem (134); Marambaia (110); Jurunas (107); Sacramenta (91); Pedreira (71); Telégrafo (69) e Cremação (67).
Crianças ameaçadas podem ter proteção - No universo dos casos atendidos pelo Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM) no Pará, 90% encontram-se ameaçados de morte por envolvimento com o tráfico de drogas, por ser usuário ou por trabalhar para o 'tráfico'. Apontados pela sociedade como 'protegidos' pela lei, os adolescentes estão isolados, servem apenas ao tráfico e por isso são condenados à morte diariamente, com sentenças cada vez mais brutais, diz o relatório do Cedeca-Emaús.
Coordenadora da entidade, Celina Hamoy explica que o programa é uma parceria entre a Secretaria de Justiça, Cedeca-Emaús e o governo federal. E destina-se a crianças e adolescentes em situação de ameaça de morte por terceiros. Essa ameaça tem que ter um mínimo de comprovação e a criança e adolescente deverá ser encaminhada para o programa pelo Ministério Público, juizes e conselhos tutelares.
Jornais - Busca nos jornais locais de Belém, nos meses de janeiro e fevereiro de 2011, mostra que traficantes têm no assassinato de adolescentes seu método e instrumento mais usual para demonstrar poder às forças de segurança e à comunidade em que vivem. A pesquisa realizada pelo Cedeca-Emaús encontrou, em pouco mais de 50 dias, 18 reportagens de homicídios de adolescente na Grande Belém. Mesmo sem uma margem estatística segura, o relatório afirma ser possível citar o município de Ananindeua como um cenário assustador. Somente entre os dias 4 e 14 de fevereiro, três notícias exemplificam isso.
No dia 13 de fevereiro, um adolescente de 17 anos foi morto e teve o coração arrancado, por causa de dívida de drogas, crime ocorrido no bairro do Curuçambá. Por motivos semelhantes, no dia seguinte, um outro jovem de 19 anos foi esmagado por um carro no bairro de Águas Lindas. Dez dias antes, um menino de 15 anos foi executado na estrada do Maguari, supostamente por estar devendo a uma traficante na área. No mesmo período, e pelas mesmas causas, outro adolescente foi morto a tiros no bairro do Jurunas, em Belém.
Fonte: Amazônia

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