13 de abril de 2011

Desarmamento: Observatorio de Favelas


Polêmica - 13/04/2011 
 
Desarmamento

Por Cecília Oliveira
Os assassinatos de adolescentes numa escola em Realengo, zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, reacenderam a discussão sobre o desarmamento da população civil. A campanha, até então idealizada para junho ou julho, foi adiantada para o início do próximo mês e o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), apresentou nesta terça-feira (12), um projeto de decreto legislativo para realizar um plebiscito no 1º domingo de outubro sobre comercialização de armas e munição. Antes de 2008, foram feitas duas campanhas e desde então o recolhimento de armas é permanente. O cidadão pode recorrer a qualquer momento à Polícia Federal para entregar sua arma.

Muita coisa está em jogo. Comércio ilegal de armas, registro e porte delas, fiscalização, sua relação com os homicídios praticados no país são assunto que estão sendo debatidos em todos os canais de comunicação. Numa entrevista ao Observatório e Análises o vice-presidente da Sangari no Brasil e ex-representante da Unesco, Jorge Werthein, responde a algumas perguntas sobre o tema. Confira:

 Jorge Werthein: "entre 2003 e 2005, por exemplo, auge das ações pró-desarmamento, as taxas de homicídio no Brasil caíram de 51.043 para 47.578 e, até 2008, não alcançaram os níveis anteriores à campanha pró-desarmamento". Foto: consecti.org.br
Jorge Werthein: "entre 2003 e 2005, por exemplo, auge das ações pró-desarmamento, as taxas de homicídio no Brasil caíram de 51.043 para 47.578 e, até 2008, não alcançaram os níveis anteriores à campanha pró-desarmamento". Foto: consecti.org.br
Qual a relação entre o número de armas e homicídios?

Não disponho desse dado. O Mapa da Violência, por exemplo, indica apenas que, no período imediatamente posterior às campanhas pelo desarmamento, os índices de homicídio caem. Permanecem baixos durante algum tempo e, depois, voltam a subir, o que demonstra a necessidade de uma ação constante no sentido de desestimular o porte de arma. Entre 2003 e 2005, por exemplo, auge das ações pró-desarmamento, as taxas de homicídio no Brasil caíram de 51.043 para 47.578 e, até 2008, não alcançaram os níveis anteriores à campanha pró-desarmamento.

É preciso impedir o comércio de armas?
Não se trata de impedir o comércio de armas, mas de evitar que civis portem armas. Há situações em que as armas se justificam. Nas mãos de profissionais da segurança pública, por exemplo, elas têm seu papel. Há empresas de segurança que também necessitam de autorização para que seus seguranças portem armas. Infelizmente, elas ainda são necessárias em algumas situações, pois inibem o crime, ao menos em certa medida. O risco está em uma população civil armada, muitas vezes sem preparo técnico e principalmente psicológico para lidar com uma arma de fogo.

Em que dimensão a campanha do desarmamento pode alcançar os fabricantes nacionais, responsáveis pelo maior número de armas em circulação no país?
Não monitoramos o sistema de fabricação e distribuição de armas. Apenas acompanhamos os índices de homicídio e verificamos que o desarmamento da população tem uma relação direta com a queda desses índices. Divulgamos isso amplamente, e nosso trabalho termina aí.

Como superar uma decisão de quase 70% da sociedade em favor da posse e porte de armas?
É preciso respeitar o desejo da maioria e, ao mesmo tempo, difundir mais e melhor a mensagem pró-desarmamento. Toda mudança exige amadurecimento, e amadurecimento demanda tempo.

O Exército e a Polícia Federal estão preparados para fiscalizar o mercado de armas ilegais?
Creio que sim. As Forças Armadas e a PF têm preparo para fiscalizá-lo. Ainda assim, o tráfico existe. Coibi-lo é um desafio inclusive para nações industrialmente mais avançadas. O controle desse tipo de contravenção envolve outros atores, além das forças governamentais.
É preciso respeitar o desejo da maioria e, ao mesmo tempo, difundir mais e melhor a mensagem pró-desarmamento. Toda mudança exige amadurecimento, e amadurecimento demanda tempo

A tragédia ocorrida em Realengo, bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro chocou a sociedade e trouxe de volta à tona o debate sobre o desarmamento. Este é o momento para tal discussão?
O momento é propício no sentido de que essa tragédia serve como "gancho" para a imprensa tratar do assunto. Por outro lado, essa questão merece uma abordagem e um tratamento menos afetados pelas emoções. Há direitos e deveres em jogo. As pessoas não podem abrir mão de ter uma arma porque sofreram pressão para isso, mas porque se convenceram de que uma sociedade desarmada é uma sociedade mais segura.

No mapa da Violência 2010, o Brasil aparece em 6° no ranking de homicídios/população total e a Suíça aparece em 84°. No que se refere a porte de armas, a Suíça tem 46 armas por 100 habitantes, e o Brasil, apenas 8. Falar de arma sozinha como causa da violência pode não dar conta da real situação? Como explicar esta relação?
É evidente que o porte de armas não explica sozinho os altos índices de violência no Brasil. Como sempre se diz, a arma é um instrumento. Quem mata são as pessoas. E elas podem fazer isso tanto com um revólver quanto com um veículo. A diferença aqui está no fato de que revólveres são fabricados para matar, enquanto veículos - entre outros objetos - não. Independentemente disso, é preciso lembrar o papel da educação nesse contexto. Consumimos muito tempo discutindo se devemos ou não ter armas de fogo em casa - discussão que me parece importante, sim -, mas consumimos bem menos tempo discutindo como educar cidadãos para que não precisem delas. Compare os índices educacionais da Suíça com os do Brasil e de outros países latino-americanos. Essa comparação me parece mais útil para ajudar a entender por que os dois países ocupam posições tão distintas no ranking de homicídio.
Observatorio de Favelas

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